A Comissão Europeia está a trabalhar há seis meses num plano para constituir uma agência de rating europeia, garantem ao i fontes de Bruxelas. Michel Barnier (na imagem), comissário europeu do Mercado Único e Serviços - responsável pelas áreas de regulação e supervisão dos serviços financeiros e agências de rating -, está a liderar o processo no seio do braço executivo da União Europeia. O modelo que está a ser analisado em Bruxelas ameaça, porém, criar fracturas políticas entre estados-membros e reguladores.
A ideia de Bruxelas é criar uma agência que avalie o risco soberano dos países europeus dotada de suficiente credibilidade para ser eficaz junto dos mercados e investidores e conseguir contrariar o oligopólio das agências norte-americanas: Moody''s, Standard & Poor''s e Fitch dominam 95% do mercado. Sucede que a possibilidade de lançar a agência europeia de rating com financiamento do Banco Central Europeu (BCE), como está a ser politicamente equacionado para dar credibilidade à nova instituição, "levanta suspeitas".
"Pode parecer que o único propósito desta agência europeia é actuar em benefício dos países que a financiam, ainda indirectamente. Porque os membros do euro são os "accionistas" do BCE"; diz ao i uma fonte que conhece as negociações. "É impossível não ver aqui um conflito de interesses potencial, do mesmo tipo daquele que agora apontam às agências americanas".
Bruxelas sustenta que o BCE é, como todos os bancos centrais nacionais, independente e autónomo dos governos e da Comissão Europeia, para além de ser uma entidade supranacional. Posteriormente, a agência europeia originaria receitas suficientes para se manter em funcionamento. O Reino Unido, que não pertence ao euro, foi um dos primeiros países a colocar obstáculos à proposta de Bruxelas, em Maio. O ministro britânico do Tesouro, David Gauke, considerou que a proposta de constituir uma agência de rating pública - lançada por Berlim - "poderia ser contraproducente" e afastar potenciais investidores privados do negócio".Em todo o caso, a Comissão Europeia conta com o apoio político do Parlamento Europeu que, num relatório de Junho, sugere a criação de uma "nova e independente agência de rating europeia, ou uma rede pequenas agências de ratings europeias" para estimular a concorrência. Recomenda também maior supervisão e regulação das actividades destas agências. Um novo pacote de legislação sobre a matéria deve ser apresentado pela Comissão Europeia no Outono.
A Comissão já terminou o processo de consultas públicas sobre as agências de rating, cujo documento foi divulgado esta semana. Segundo o relatório, "não existe um apoio significativo [na UE] para que o BCE ou os bancos centrais nacionais estabeleçam ratings. Alguns governos e reguladores apoiaram esta ideia, mas outros são cépticos quanto ao envolvimento do sector público na esfera dos ratings". O documento também revela que a criação de novas agências nacionais [nos estados-membros] tem algum apoio europeu, mas há "governos, grupos financeiros e agências de rating contra a intervenção estatal para estimular novas entradas" no mercado. Por fim, o relatório revela que "alguns reguladores nacionais e várias empresas privadas se opõem à criação de uma nova agência de rating europeia". "A redução das notas de rating da Grécia (em 2010) e Portugal criaram agora condições políticas para avançar de facto com uma entidade europeia", diz uma fonte diplomática europeia.Ontem, foi a vez do presidente do BCE juntar-se à onda de críticas, depois de a Moody''s ter cortado o rating de Portugal para o nível "lixo", agravando ainda mais a crise da dívida na zona euro.
Jean-Claude Trichet manifestou-se contra o domínio das três agências norte-americanas: "A pequena estrutura oligopólica" das agências de notação financeira "não é desejável". Poderá ser agora chamado a equilibrar o poder nos mercados. O presidente do Eurogrupo, Jean-Claude Juncker, disse ontem que apoia a criação de uma agência europeia e deixou um aviso: "Se as agência de rating continuarem a actuar desta maneira, irão perder relevância."Não foi só em Portugal que o corte da Moody''s foi recebido como um murro no estômago. A cúpula de Bruxelas considerou o downgrade despropositado. "É preciso questionar ao serviço de quem estão as agência as rating e porque é que não cortam o rating dos EUA - quando há a possibilidade de bancarrota do país - ou da Irlanda", referiu ao i o eurodeputado Mário David.
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